- 31 de março de 2022
- Oficial de Justiça Comarca de Linhares e Instrutor de Defesa Pessoal
Eduardo Fachetti -
Nunca houve qualquer tipo de instrução ou treinamento de prevenção à violência

O Brasil é um dos países mais violentos do mundo. O mapa da violência de 2019, embora traga uma boa notícia - a de que houve uma baixa no número de homicídios em relação ao ano anterior - ainda é alarmante, porque o número de homicídios continua altíssimo: foram 45.503, enquanto em 2018 foram 57.956.
Neste contexto, o número de mortes na segurança pública também vem aumentando. Em 2020 foram 198 policiais assassinados.
Quanto ao número de Oficiais de Justiça vitimados, não há um número oficial divulgado, mas um dossiê elaborado pela ASSOJAF-GO - ASSOCIAÇÃO DOS OFICIAIS DE JUSTIÇA AVALIADORES FEDERAIS DE GOIÁS - em 2017, registra que, de 2000 a 2017, foram 27 assassinatos de Oficiais de Justiça, incluídos em um número total de 145 situações de violência registradas contra a categoria no mesmo período.
Importante salientar que o efetivo policial no Brasil é de 500 mil homens, enquanto o efetivo de Oficiais de Justiça é de cerca de 70 mil, ou seja, Oficiais de Justiça são pouco mais de um décimo do efetivo de policiais no Brasil.
A conclusão é óbvia: se há muita violência dentro da população em geral e há ainda mais violência contra os agentes da segurança pública, é certo que a violência contra os Oficiais de Justiça também tem aumentado continuamente, uma vez que o Oficial de Justiça se encontra em um patamar intermediário, pois faz parte da população e ainda exerce um cargo que não chega a ser parte do enfrentamento direto da violência como a atividade policial, mas está em contato com todos os agentes criminosos na fase de persecução penal.
Se a violência aumenta, o mesmo não ocorre com a preocupação e os investimentos dos Tribunais para tentar minimizar os riscos da atividade.
Nunca houve qualquer tipo de instrução ou treinamento de prevenção à violência.
Não há a garantia do porte de arma funcional, não há efetivo suficiente para que se possa cumprir alguns mandados em dupla, pois - ainda que a própria Lei por vezes recomende e até mesmo determine que assim se faça - há excesso de mandados e falta de pessoal.
Quanto ao porte de arma funcional, que deveria ser natural ao cargo desde sua criação, ainda não ocorre por questões puramente burocráticas e de “esquecimento” de nossos legisladores.
As Leis Orgânicas da Magistratura e do Ministério Público preveem expressamente o porte de arma como prerrogativas de seus membros, mas não há qualquer previsão legal neste sentido para os servidores do Poder Judiciário.
No Estatuto do Desarmamento, mais uma vez, o legislador esqueceu de fazer constar os Oficiais de Justiça no rol das pessoas que podem portar armas de fogo prevista no artigo 6º daquela Lei.
Vivemos hoje, com o absurdo fato de que é permitido o porte de arma para o Magistrado, servidor público que expede a decisão judicial da segurança de seu gabinete, dentro de um fórum guarnecido por Policiais Militares e/ou segurança privada; mas é proibido o porte de arma para o Oficial de Justiça, servidor que vai dar efetividade àquela decisão, sozinho na rua.
Há um Projeto de Lei tramitando atualmente no Congresso Nacional, a PL 3722/2012, que pretende uma ampla alteração no Estatuto do Desarmamento, prevendo a inclusão de outras pessoas no rol das que podem portar armas, bem como uma certa flexibilização quanto a alguns requisitos, mas um simples projeto de lei, no Brasil, não quer dizer garantia de nada, já que inúmeras emendas podem ocorrer e o texto pode ser alterado várias vezes, sem contar o tempo que pode levar, pois já se vão 10 anos desde a apresentação do projeto.
A conclusão é a de que não dá para esperar somente por uma providência do Legislativo, enquanto isso não vem, os Tribunais, caso queiram, podem suprir essa carência com treinamentos e talvez uma simples intervenção junto à Polícia Federal (que é a responsável pela expedição de autorização de portes de arma de fogo) para que aqueles Oficiais que queiram, possam ter acesso ao equipamento.
Agora, é importante ficar muito claro que o acesso à arma de fogo somente não melhora em nada a segurança dos Oficiais de Justiça. O que é mais imprescindível é o que já deveria ocorrer desde sempre: treinamento e capacitação dos servidores para que aprendam a lidar com o gerenciamento de crises, evitando a ocorrência de situações de violência, criando um procedimento padrão de atuação e minimizando os riscos da atividade.
Essas providências podem ser tomadas pelo Tribunal imediatamente, basta ter interesse.
Eduardo Fachetti
Oficial de Justiça Comarca de Linhares e instrutor de defesa pessoal
Instrutor Chefe da Empresa SORUDO no Brasil - Especialista em Treinamentos de Gerenciamento de Crises